É isso. Bram & Vlad estão fazendo 10 anos em 12 de abril. Wow.
Vai acontecer um evento muito, MUITO especial nessa época, então, fiquem espertos. A primeira tirinha faz 10 anos no dia 25 de agosto, o que será (assim espero) marcado por outro evento bem especial.
Por hoje, eu só gostaria de tagarelar um pouco sobre a história dos meninos. Estou me sentindo sentimental, não levem as coisas muito a sério.
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Quando eu tinha mais ou menos 10 anos, eu tinha um personagem muito especial. Uma fotinho dele, que não faz muita justiça ao cara, é essa:
Eduardo era minha cobaia para qualquer experimento mental esquisito que eu estivesse fazendo na época. Ele foi um cientista louco mirim, um personagem à la Zorro na escola dele (com identidade secreta e tudo), um agente secreto/detetive, um vampiro por três dias (e eventualmente o protótipo para meios-vampiros em Bram & Vlad), um comerciante de informações vitoriano (possivelmente minha versão favorita dele) e, agora, ele mais ou menos estabilizou como o cara da TI da Polícia Dimensional. (Curiosidade: o Lauro - estou apresentando o fulano na página do facebook, curte lá - tem um rabinho de cavalo em homenagem ao Eduardo, mas é só o que eles têm em comum.)
Em algum ponto entre "agente secreto" e "vampiro por acidente" (longa história), decidi criar alguma coisa contando a infância dele. Nela, ele e seus amigos eram capazes de entrar em livros que estavam "estragados" (as histórias deles começavam a desaparecer porque alguma coisa estava atrapalhando o plot). Eles tinham que consertar a história para consertar o livro. Soa como um desenho animado, porque FOI inspirado por desenhos animados. Não consigo lembrar muito as histórias que eles visitaram enquanto eu brincava com essa ideia, mas lembro uma. Tenho que lembrar, porque acabou sendo tão importante. Foi quando eles entravam em "Drácula".
Assim, quando criei esse 'episódio' (nunca cheguei a escrever, tudo se passava na minha mente, pra passar o tempo), eu só conhecia Drácula de um filme ruim e da cultura pop. Eu sabia vagamente que a história envolvia um vampiro no castelo dele, seu hóspede infeliz, um caçador de vampiros com um nome engraçado e mocinhas bonitas em algum ponto. Sabendo que esse foi meu ponto de partida faz com que eu me sinta admirada de que funcionou tão bem.
A história era bem simples, como um episódio de 20 minutos de um desenho: Eduardo entra em "Drácula" porque o texto está desaparecendo e descobre que os personagens, por alguma razão, viraram crianças. Ele assume o papel de "Jonathan Harker" (eu não sabia o nome do cara ainda) e visita o Castelo Drácula. Lá, ele conhece Drácula... um garotinho vampiro muito solitário que só quer um amigo. No início, Eduardo fica com pena dele, e eles se aproximam por terem gostos nerds parecidos. O problema é que o Drácula-menino planeja transformar o novo amigo em vampiro, e ele meio que não quer isso. Confusões loucas de verão acontecem e tudo acaba com um Van Helsing criança (e sem nome, porque eu ainda não sabia) invadindo o castelo com a ajuda dos aldeões próximos para salvar Eduardo e seus amigos. O Drácula-menino fica com raiva e jura vingança. O livro volta ao normal, já que agora ele vai crescer e se tornar o vampiro malvado que todos conhecem, e Van Helsing vai crescer para lutar com ele de novo.
Não pensei muito mais nisso na época, já que eu queria mostrar os dois viajando em outras histórias, mas alguma coisa no fundo da minha mente não estava feliz: essa era uma história muito triste e cinzenta. Uma criança solitária, que só queria um amigo, não só não conseguir isso, mas crescer e virar um assassino? Que diabos, cérebro?! Como gosto de revisitar histórias antigas o tempo todo, nos anos seguintes (isso aconteceu por volta de 1999-2000), minha mente voltaria constantemente a essa história, querendo um final mais feliz. O problema é que um final feliz não consertaria o livro. Drácula é mau. Ainda assim, eu continuava criando um final não-canônico alternativo em que Eduardo consegue parar os aldeões revoltados e apresentar Drácula e Van Helsing, fazendo os dois meninos se tornarem amigos.
Essa ideia flutuaria na minha mente por um tempo, e toda vez eu me sentia triste por um menino vampiro ficcional que eu mesma criei. A mente de um escritor é um lugar estranho.
Então, em 2003 (ou 2004? Não lembro), consegui minha primeira cópia de Drácula (está agora com um dos meus alunos, espero que ele goste). Eu não gostei muito na primeira leitura, mas algumas coisas tiveram uma ressonância legal comigo. Depois de um tempo, li de novo e gostei muito mais. Foi nesse ponto que aquela história dos personagens crianças voltou à tona. Eu não tinha muita razão para insistir nela, a não ser o fato que uma parte de mim nunca ficaria feliz enquanto eu não desse àquele vampirinho solitário um amigo. Nesse ponto, comecei a chamá-lo de Vlad (porque chamar um menininho de "Conde Drácula" soa estranho, e eu pensava ainda que o Drácula era o Vlad III), e o menino caçador de vampiros se tornou "Bram" (de novo, "Abraham" era um nome que soava muito velho para um menino, e eu estava tão orgulhosa de mim por descobrir que o nome verdadeiro do Bram Stoker é Abraham Stoker, "Bram" sendo só um apelido). Bram e Vlad. O som disso era legal.
Não sei dizer ao certo quando, mas por volta de 2005-2006, decidi que o "final feliz" alternativo da história do Eduardo, aquela em que o vampirinho e o menino caçador viravam amigos, não aconteceu com os personagens do livro Drácula, mas com seus filhos. Ainda era um pouco trágico, ter dois grandes amigos cujas famílias estavam tentando se matar, mas era muito mais otimista que a história original.
Pelo fim de 2006, eu comecei a querer tanto desenhar uma HQ. Tanto. Eu já tinha feito uns experimentos antes, mas agora eu sentia que queria algo que eu pudesse produzir constantemente. Não uma HQ grande e ambiciosa. Só uma tirinha, talvez, já que eu AMAVA tirinhas de jornal. Minha primeira cobaia foi o Eduardo (como sempre), mas apesar de ele ser sarcástico pra caramba (algo que nunca mudou em sua personalidade), ele não era o tipo que participava de piadas bobas. Depois de fazer uma tirinha com ele e não vir mais nenhuma ideia, decidi usar a personagem que era minha cobaia preferida dessa época: Strix, aquela que me deu meu nick em quase tudo na internet. Ela já era uma personagem exagerada e cartunesca, não devia ser difícil. Dei a ela uma "parceira" (baseada na minha melhor amiga), mas, de novo, isso não foi muito longe. Nesse ponto, eu gostava mais de
escrever sobre ela. Pois é, onde então eu poderia conseguir dois personagens sem quase nenhum desenvolvimento, cujos nomes soavam legais juntos (numa vibe meio Calvin & Haroldo)?
Oh.
E foi assim que Bram & Vlad surgiu. Antes de fazer os primeiros roteiros (publicados no meu blog, e abril de 2007), eu passei um bom tempo decidindo como eu deveria abordar essa tirinha. Descartei logo de cara a ideia de fazê-los filhos do Drácula e do Van Helsing pra valer, porque isso era fins de 2006. Eu não tinha nem um computador, usando os da universidade, quando mais um celular que pudesse fazer mais que ligar e rodar o jogo da cobrinha. Eu simplesmente não tinha nenhuma condição de desenhar roupas de época e garantir que eu iria representar com alguma fidelidade o período vitoriano. O mais próximo que eu tinha de fonte era minha coleção completa de livros do Sherlock Holmes.
Mais ou menos perto da época que escrevi esses roteiros, comecei a rabiscar os meninos. Os roteiros indicam que, nesse ponto, eu já tinha decidido os designs deles, mas eu honestamente não sei se descrevi os dois no roteiro primeiro, ou se eu estava descrevendo um rascunho inicial.
Se estiverem curiosos, esses são os primeiros conceitos de Bram e Vlad:
Você vai notar que eles são muito mais próximos de cartuns americanos, o Vlad se vestia como um vampiro mais tradicional e o Bram tinha o cabelo liso. Não mantive esse estilo porque não consegui desenhar consistentemente. Dava muito trabalho e, nessa época, B&V era só um exercício de desenho de quadrinhos, não algo que eu imaginava que ainda estaria fazendo dez anos no futuro.
Outro desenho conceitual, dessa vez mais próximo do produto final:
Você vai notar que Bram ainda tem cabelo liso, seu lenço no pescoço ainda não tem o estilo de "escoteiro" que ele usaria nas primeiras tirinhas e o Vlad ainda tem orelhas pontudas e um cabelo menos punk.
E, claro, tem o "piloto" (a primeira tirinha, uma piada besta que nem sequer é original).
Bram já tem seus pinotinhos no cabelo aqui, para diferenciá-lo de outro personagem meu. Vlad já está no seu design final. Eu não voltaria a usar tons de cinza numa tirinha até o Ano 2, e eu também bani pontilhado, porque MORRA PONTILHADO.
O estilo final acabou sendo muito mais simples, e dei ao Bram um cabelo cacheado para ele ter uma silhueta mais distinta. Era bem mais cacheado nesse tempo.
Eu iria dar um reboot no Ano 1 muito tempo depois, e fiz o livro que pus pra vender há não muito tempo com essas tirinhas. Você pode ver as tirinhas originais do Ano 1 e o reboot na página do facebook. Sério, se quiserem ver tirinhas antigas, lá é o melhor lugar, porque é mais agradável de navegar.
Mas enfim. A história dos meninos mudou quase tanto quanto a arte. Quando eles começaram, como eu disse, eram só personagens quase sem desenvolvimento, duas tábulas-rasas. O objetivo das tirinhas era só "haha, olha que engraçado as conversas deles!". A maioria das tirinhas não tinha nada a ver com vampiros, eram só piadas aleatórias (algumas BEM aleatórias). Comecei a ficar incomodada lá pelo fim de 2008, e foi quando comecei a trabalhar para fazer Bram e Vlad mais próximos do que eu tinha imaginado em primeiro lugar: uma história de dois amigos, e como eles mudam a vida um do outro.
Até o Ano 3, eu mais ou menos ignorava "Drácula" (o livro). Quando eu parava para pensar sobre ele, o máximo que eu fazia era assumir que os ancestrais deles eram uma contraposição à amizade deles, que os dois começaram como amigos, mas deu errado em algum ponto. Lá pelo Ano 3, comecei a planejar as coisas melhor, para que eu pudesse explicar às pessoas como as tirinhas e o livro se relacionavam. O problema é, quando mais eu planejava, menos eu conseguia fazer esse trem de "amizade dando errado" funcionar. Mas eu ainda queria fazer a relação entre Drácula e Van Helsing ter algum tipo de paralelismo com os descendentes deles, então concedi que o livro continuava 100% canônico nas tirinhas, mas havia "cenas secretas" que davam um sentido diferente a certos acontecimentos. Cheguei a começar uma tentativa de escrita aqui nesse blog para explicar essas "cenas ocultas". Tentei fazer isso funcionar com toda a minha força, mas os problemas não paravam de aparecer, e nunca consegui uma forma decente de ajeitar a história como eu queria (é por isso que as tirinhas do arco do Álbum parecem ter um pedaço faltando - eu ainda não estava muito certa de todos os detalhes que precisava para fazê-las).
Chegou num ponto que decidi que os temas de amizade, família e legados em B&V eram mais importantes para mim do que aderir cegamente ao canon do livro. Eu tentei o máximo que pude, mas, no fim do dia, ninguém estavam me pagando para escrever uma fanfic de Drácula totalmente fiel ao livro, que não o contradiz de forma alguma (além disso, o livro é um monte de diários costurados, não tem nada impedindo aqueles personagens de mentir). Eu faço B&V porque eu gosto, e se eu quisesse tomar liberdades com o canon do livro, NINGUÉM PODERIA ME IMPEDIR, HAHAHAHAH.
E é nesse ponto que estamos hoje. Tentei não desfigurar o livro muito, mas não estou tentando encaixar tudo com o canon tão obsessivamente. O fim de Bram & Vlad, agora, é muito mais próximo do que eu imaginei no início, mas muito melhor. Seja em tirinhas, seja nos livrinhos, B&V continua sendo a história da vida de dois amigos, e de como um muda tanto a vida do outro.
Família, legados, pacifismo, aceitação... Bram & Vlad tenta abarcar isso tudo. Mas estou muito, muito feliz que, 10 anos depois, isso ainda é - em vários níveis - uma história sobre um vampiro muito solitário que encontra um amigo meio esquisito, mas muito leal. E tudo finalmente termina bem.